Produções orientadas de estudantes de Jornalismo da PUC-Rio

Manuela Guedes*

 

A praia é um dos espaços públicos mais democráticos na cidade do Rio de Janeiro. Foi a partir dessa ideia que a diretora brasileira Cecília Lang construiu o documentário “Bola pro Alto!”. O longa-metragem apresenta a altinha, prática que nasceu nas areias da Zona Sul e hoje reconhecida como esporte, propondo uma diversidade narrativa a partir de visões e experiências plurais de praticantes. Em comum, evidencia o grande impacto positivo na vida de quem joga. A própria expressão que dá nome ao longa-metragem tem a ver com uma espécie de filosofia do jogo, que é de esquecer os problemas e curtir o momento de forma leve.

O documentário também demonstra como o esporte e a cultura da praia se configuram como marcadores de um espaço de sociabilidade. Apresenta os “points” famosos para a juventude e que foram ou ainda são influentes na altinha carioca, como o atual “Coqueirão” e o “Píer” nos anos 70, ambos em Ipanema. 

A volta no tempo para reconstruir a história dessa prática esportiva revela ainda a inserção das mulheres na altinha. Janaína do Mar, uma das pioneiras na prática do esporte, relata como sofreu machismo não só por parte de homens que jogavam, mas também de mulheres que frequentavam os famosos “points” das areias. Se, no início, quase nenhuma mulher participava, hoje, em campeonatos, é regra haver pelo menos uma jogando nas rodas.

Na busca da reconstrução da história da altinha, o filme também esclarece regras e termos utilizados pelos jogadores. Os entrevistados explicam que as regras variam em relação ao tempo da bola no ar, as manobras usadas e que seja apenas um toque por pessoa, no máximo dois, sendo um deles para ajeitar a bola. E que os jogadores se diferem em ponteiros e levantadores. O próprio termo “altinha” é motivo de conflito, pois era usado pelo pessoal que frequentava a área perto do tradicional Country Club, diferente dos frequentadores do Posto 10, que consideram o nome do esporte como “altinho”.

A multiplicidade ao abordar a cultura da praia inclui a vivência da própria diretora com o esporte e o ambiente praiano carioca. Um dos pontos mais interessantes de ‘Bola pro alto!’ é justamente a interlocução entre as histórias narradas em entrevistas com os personagens e a própria narração de Cecília, que carrega uma memória emocional com forte vínculo simbólico. Ao mesmo tempo que o espectador descobre um pouco mais sobre as praias da Zona Sul carioca e a altinha, também é transportado para parte da história de vida da diretora.

Por sua vez, a diversidade socioeconômica, também característica do público das praias cariocas, não tem tanto lugar no documentário, que centraliza a narrativa em personagens da Zona Sul. Apenas no início há registro de frequentadores de outras regiões, sobre como era chegar até Ipanema e Copacabana para curtir a praia. Mas, uma vez que a altinha se popularizou, como é a relação dos cariocas das zonas Norte, Oeste com o esporte? “Bola pro Alto” acerta em enaltecer esta cultura tipicamente carioca, mas fica devendo aprofundar a pluralidade que se propõe a tratar. 

Já premiado no Cine Esporte 2024, o documentário ‘Bola Pro Alto!’ venceu o Prêmio Especial de Melhor Longa Metragem no 42º Festival Internacional de Cinema, Esporte e TV (Ficts), realizado na Itália, do 4 ao 9 de novembro. 

*Aluna do 4º período de jornalismo.