Dirigido por Pedro Geraldo e protagonizado por Sofia Tomic, filme independente premiado, em cartaz no Rio, aborda as angústias de universitários
Pedro Coutinho
Em Sofia foi, uma jovem tatuadora vaga pela Universidade de São Paulo após ser despejada de casa por um amigo. Como o título indica, Sofia vai, caminhando por corredores, sem objetivo. Próxima da câmera e quase sempre na penumbra, a protagonista, interpretada por Sofia Tomic, é assombrada por memórias neste coming of age pouco convencional. O primeiro longa-metragem do paulistano Pedro Geraldo, que assina o roteiro com Tomic, mostra uma versão introspectiva do início da vida adulta, o lado melancólico e solitário do amadurecimento. Depois de passar por festivais na França, no Peru, no México, na Itália e em Tiradentes, Minas Gerais, o filme está em circuito comercial.
Foram seis anos desde as gravações do projeto independente, que surgiu de uma preocupação geracional com a transição do ambiente universitário para o mercado de trabalho, a partir de notícias de jovens que perderam a vida no campus: “Essas tragédias mexeram muito comigo. Eu não entendia como isso pode acontecer em um espaço de formação e amadurecimento que deveria ser seguro”, conta Geraldo. Formado em Cinema pela Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), procurou a amiga, então aluna de Arquitetura na USP, com a ideia de um filme ambientado na universidade, que para ele era um ponto de encontro com amigos. Na visão dele, o fato de o lugar não fazer parte de seu dia a dia preservava uma estranheza interessante para o longa.
A escrita do roteiro se deu durante a filmagem e a edição. Sofia explica que, de início, não havia uma divisão clara entre documental e ficcional: “Por conta da intenção documental, a construção da personagem para mim não era muito complexa no sentido de criar uma nova psique. Eu pude me ater a como eu reagiria às coisas sinceramente”.
O objetivo de Geraldo era encontrar um tom que expressasse um momento de confusão interna. Os corredores se tornam cenário de solidão e incertezas nem sempre expressas pela personagem, que evita expor sentimentos. “Outros personagens verbalizam coisas que a protagonista não fala”, explica Tomic. Para a protagonista, a introspecção partiu de um interesse mútuo em criar a sensação de um mistério não solucionado. Segundo Geraldo, o filme caminhou para um tom específico ao longo do processo. A espontaneidade trouxe momentos que misturam o ficcional e o documental.
A montagem levou cinco anos, em meio à pandemia, a uma mudança de país e a substituição de profissionais da equipe. Com o primeiro corte fechado, inscreveram o projeto no laboratório do Festival de Marselha, na França, na tentativa de conseguir investimento de um parceiro estrangeiro para a finalização, que necessitava de muito dinheiro e estrutura. O comitê de seleção quis que a obra fosse exibida não no laboratório, mas na competição da mostra. E o longa foi finalizado em um mês e meio.
“Usamos o nosso dinheiro e o de amigos, em um esquema ultrapequeno e de muito companheirismo. A partir da nossa estreia em Marselha, tivemos outra surpresa quando ganhamos um prêmio. E aí as coisas foram acontecendo”.
Depois de vencer o prêmio de Melhor Primeiro Filme em sua estreia na França, a obra seguiu um circuito de festivais, que incluiu o 41º Festival de Torino, na Itália, e a 27ª Mostra de Cinema de Tiradentes, em Minas Gerais, até entrar em cartaz, pela distribuidora Vitrine Filmes.
Por mais que o público seja restrito, Geraldo reforça a importância dos festivais em fomentar a discussão até que o projeto chegue a uma distribuidora. Ainda assim, para o cineasta, o alcance de seu primeiro filme é uma mistura de crença e acaso:
“É da ordem do absurdo uma coisa tão pequena ter chegado agora em circuito comercial, em um país que tem a distribuição tão mal resolvida. Mas que isso dê coragem para outras distribuidoras, e para a própria Vitrine, tomarem esse tipo de risco”.